terça-feira, 7 de outubro de 2014

ATALANTA E HIPOMENES: UMA HISTÓRIA DE AMOR


Queridíssimo amigo Diário,

Depois de um longo e tenebroso inverso, cá estou eu hoje para relatar a linda e trágica história entre Atalanta e Hipomenes.
Logo depois de seu nascimento Atalanta foi abandonada numa floresta por seu pai que desejava descendentes masculinos. Nas montanhas uma ursa amamentou a criança. Certa vez, quando uns caçadores passavam por aquela região, encontraram a criança, levaram-na e a criaram. Atalanta cresceu nas frescas montanhas recobertas de florestas, tornando-se forte e ágil como uma gazela e seu maior prazer era caçar com sua lança.
Em Calidon os primeiros frutos da colheita deviam ser sacrificados aos deuses. Infelizmente o rei Eneus esqueceu-se do sacrifício e, por isso, Artemis furiosa com a negligência enviou sobre o seu reino um enorme e furioso javali, que destruia plantações e colheitas. O rei mandou chamar os mais nobres homens para lutar contra o terror e o vencedor receberia a pele do javali. No entanto, como nenhum homem conseguisse vencê-lo, Atalanta se ofereceu e conseguiu lutar e vencer o terrível javali.
Assim Atalanta conquistou a reputação de grande caçadora. Seu pai a procurou levando-a para seu reino. Ela tinha o rosto muito masculino para uma mulher e. ao mesmo tempo, muito feminino para um homem. Sobre seu destino foi-lhe revelado: “Não te cases, Atalanta, porque o casamento será tua ruína”.
Essa predição a atemorizou de tal forma que ela decidiu fugir da companhia dos homens, dedicando-se inteiramente aos exercícios corporais e à caça. Quando algum pretendente à sua mão tornava-se mais insistente, ela geralmente se livrava da perseguição impondo-lhe uma regra: “Eu serei o prêmio daquele que conseguir vencer-me numa corrida, mas a morte será o castigo de quem tentar e perder”.
Apesar do risco que acompanhava essa proposta, muitos candidatos já haviam tentado conquistá-la sem sucesso e em todas as oportunidades o jovem Hipomenes tinha sido o juiz da disputa. A princípio ele se perguntava indiferente: “Será possível que alguém seja tão louco a ponto de arriscar sua vida desse modo, só para conquistar uma esposa?”. Até que um dia ao vê-la tirar as vestes para disputar uma das provas, ele entendeu a razão pela qual os interessados continuavam a chegar, e murmurou consigo mesmo: “Perdoai-me jovens, eu não sabia qual era o prêmio que irias disputar”.
Hipomenes passou a desejar que todos os candidatos fossem derrotados. Esse sentimento crescia e se tornava mais forte a cada vez que o rapaz via a virgem correr. Para ele, nesses momentos ela ficava ainda mais bela, mais desejável, com os cabelos soltos agitando-se sobre os ombros e o rubor do esforço físico lhe coloria a face. Ao mesmo tempo, a brisa parecia dar-lhe asas aos pés e assim os concorrentes ficavam para trás, distanciados e eram mortos impiedosamente ao final da disputa.
Certo dia Hipomenes não mais se conteve e, fixando seus olhos nos olhos de Atalanta, ele disse: “Por que te vanglorias de vencer esses lerdos? Eu me ofereço para a disputa”. Sem saber o que responder, Atalanta apenas pensou: “Que deus pode tentar um homem tão jovem e tão belo a se arriscar dessa maneira? Tenho pena dele, não por causa de sua beleza mas sim porque é tão moço. Bom seria que desistisse ou caso seja tão louco para insistir, que me vencesse”.
Diante da sua hesitação de Atalanta, os espectadores reagiram. Enquanto isso, Hipomenes implorava ajuda de Afrodite, deusa do amor: “Ajude-me, senhora, pois foste tu que me impeliste a amá-la”. Ouvindo a súplica, Afrodite que tinha nos jardins uma árvore de folhas e ramos amarelos com frutos de ouro, colheu três frutos e sem que ninguém notasse, os entregou a Hipomenes, já posicionado na linha de partida, ensinando-o como usá-los.
Dado o sinal de largada, Atalanta e Hipomenes partiram na corrida incentivados pela plateia. Logo Hipomenes começou a respirar com dificuldade, sentindo a garganta seca, as pernas se tornando pesadas, o ímpeto diminuindo, apesar da meta ainda se encontrar distante. Seguindo as instruções de Afrodite, Hipomenes deixou cair uma das maçãs de ouro e Atalanta admirada parou para pegá-la, permitindo que Hipomenes ganhasse dianteira.
Mas Atalanta voltou a correr e logo alcançou o adversário. Ao percebê-la Hipomenes largou a segunda maçã. Novamente Atalanta parou para pegá-la mas reiniciou a corrida aproximando rapidamente do desafiante. Quando estava quase a ultrapassá-lo, próximo da linha de chegada, Hipomenes viu que só lhe restava apenas uma oportunidade e mais uma vez suplicou para Afrodite: " Oh deusa, faça frutificar tua dádiva" e jogou a última maçã de ouro.
Enquanto Atalanta se distraiu com a árvore de ouro que crescia, Hipomenes venceu a corrida. Atalanta ficou satisfeita com o presente de Afrodite e Hipomenes por ter conseguido vencer. Porém, felizes na comemoração se esqueceram de agradecer à deusa Afrodite. Com essa ingratidão não ficaram impunes os ofensores: a deusa Cibele que punia a ingratidão os fez perder a forma humana: Atalanta foi transformada em leoa e Hipomenes em um leão. Eles foram atrelados ao carro da deusa, onde ainda podem ser vistos em todas as suas representações, na escultura e na pintura.
Pois é, querido amigo Diário, a profecia se cumpria: o casamento acabou sendo a ruína Atalanta.



domingo, 25 de maio de 2014


GAIA, A MÃE DA TERRA


Queridíssimo amigo diário,

Após um longo período afastado de você, cá estou eu trazendo-lhe algumas novidades: a primeira é que a minha ausência deveu-se ao fato de - após um passeio despretensioso - eu ter me perdido nos confins do planeta Terra. A segunda novidade é presença de Gaia em minha vida. Foi ela quem me libertou de lá e me mandou de volta ao Olimpo.
Dizem os estudiosos que Gaia é a Mãe Terra, que é um elemento primordial e latente de uma potencialidade geradora incrível. Segundo Hesíodo, no princípio de tudo surge o Caos, e do Caos nascem Gaia, Tártaro, Eros (o amor), Érebo e Nix (a noite).
Ainda de acordo com esses estudiosos, Gaia gera sozinha Urano, Ponto e as Óreas (as montanhas). Ela gerou Urano, seu igual, com o desejo de ter alguém que a cobrisse completamente, e para que houvesse um lar eterno para os deuses "bem-aventurados".
Com Urano, Gaia gerou os 12 Titãs: Oceano, Céos, Crio, Hiperião, Jápeto, Teia, Reia, Têmis, Mnemosine, a coroada de ouro Febe e a amada Tétis; por fim nasceu Cronos, o mais novo e mais terrível dos seus filhos, que odiava a luxúria do seu pai.
Urano e Gaia geraram, ainda, os Ciclopes e os Hecatônquiros (Gigantes de Cem Mãos e Cinquenta Cabeças). Entanto, sendo capaz de prever o futuro, Urano temeu o poder de filhos tão grandes e poderosos e os encerrou novamente no útero de Gaia. Ela, que gemia com dores atrozes sem poder parir, chamou seus filhos Titãs e pediu auxílio para libertar os irmãos e se vingar do pai. Somente Cronos aceitou.
Gaia então tirou do peito o aço e fez a foice dentada. Colocou-a na mão de Cronos e os escondeu, para que, quando viesse Urano, durante a noite não percebesse sua presença. Ao descer, Urano, para se unir mais uma vez com a esposa, foi surpreendido por Cronos, que atacou-o e castrou-o, separando assim o Céu e a Terra. Cronos lançou os testículos de Urano ao mar, mas algumas gotas caíram sobre a terra, fecundando-a. Do sangue de Urano derramado sobre Gaia, nasceram os Gigantes, as Erínias as Melíades. Após a queda de Urano, Cronos subiu ao trono do mundo e libertou os irmãos. Mas vendo o quanto eram poderosos, também os temia e os aprisionou mais uma vez. Gaia, revoltada com o ato de tirania e intolerância do filho, tramou uma nova vingança.
Quando Cronos se casou com Reia e passou a reger todo o universo, Urano lhe anunciou que um de seus filhos o destronaria. Ele então passou a devorar cada recém nascido por conselhos do pai. Mas Gaia ajudou Reia a salvar o filho que viria a ser Zeus. Reia então, em vez de entregar seu filho para Cronos devorar entregou-lhe uma pedra, e escondeu seu filho em uma caverna.
Já adulto, Zeus declarou guerra ao pai e aos demais Titãs com a ajuda de Gaia. E durante cem anos nenhum dos lados chegava ao triunfo. Gaia então foi até Zeus e prometeu que ele venceria e se tornaria rei do universo se descesse ao Tártaro e libertasse os três Ciclopes e os três Hecatônquiros.
Ouvindo os conselhos de Gaia, Zeus venceu Cronos, com a ajuda dos filhos libertos da Terra e se tornou o novo soberano do Universo. Zeus realizou um acordo com os Hecatônquiros para que estes vigiassem os Titãs no fundo do Tártaro. Gaia pela terceira vez se revoltou e lançou mão de todas as suas armas para destronar Zeus.
Num primeiro momento, ela pariu os incontáveis Andróginos, seres com quatro pernas e quatro braços que se ligavam por meio da coluna terminado em duas cabeças, além de possuir os órgãos genitais femininos e masculinos. Os Andróginos surgiam do chão em todos os quadrantes e escalavam o Olimpo com a intenção de destruir Zeus, mas, por conselhos de Têmis, ele e os demais deuses deveriam acertar os Andróginos na coluna, de modo a dividi-los exatamente ao meio. Assim feito, Zeus venceu.
Em uma outra oportunidade, Gaia produziu uma planta que ao ser comida poderia dar imortalidade aos Gigantes; todavia a planta necessitava de luz para crescer. Mas ao saber disto Zeus ordenou que Hélio, Selene, Eos e as Estrelas não subissem ao céu, e escondido nos véus de Nix, ele encontrou a planta e a destruiu. Mesmo assim Gaia incitou os Gigantes a colocarem as montanhas umas sobre as outras na intenção de subir o céu e invadir o Olimpo. Mas Zeus e os outros deuses venceram novamente.
Como última alternativa, enviou seu filho mais novo e o mais horrendo, Tifão para dar cabo dos deuses e seus aliados, mas os deuses se uniram contra a terrível criatura e depois de uma terrível e sangrenta batalha, eles conseguem vencer o último filho de Gaia.
Enfim, Gaia cedeu e acordou com Zeus que jamais voltaria a tramar contra seu governo. Dessa forma, ela foi recebida como uma titã Olímpica. Mas para chegar ao Olimpo, ela precisaria de um guia. E foi aí que entrei na história. Ela encontrou-me chorando e quis saber o porquê das minhas lágrimas. Contei-lhe que morava no Olimpo e que ali eu estava perdido. Daí ela me fez uma proposta: se eu lhe mostrasse o caminho que leva a Olimpo, ela me libertaria da Terra. E aqui estou eu, amigo diário, contando-lhe a história dessa minha nova (e pouco confiável) amiga.