segunda-feira, 20 de outubro de 2008


LILITH, A DEUSA DA NOITE


Meu amigo e confidente diário,

Quando retornava eu do psicanalista, encontrei a ninfa Rosane Volpatto (freqüentadora assídua dos jardins do Éden) passeando absortamente pelo bosque. Aproximei-me dela e fui logo perguntando “que bons ventos traziam-na” ao Olimpo. Ela então me respondeu que nos fora enviada para contar-nos as desventuras de Lilith, supostamente a primeira esposa de Adão, primeiro habitante do Éden. Ela contou-me uma das versões sobre a Criação de Lilith: disse-me que, segunda a mitologia Hebréia, Yahvé fez Lilith à imagem e semelhança de Adão. Porém, no lugar de usar terra limpa, tomou a sujeira e sedimentos impuros da terra e deles formou uma mulher. E como era de se esperar, essa criatura resultou ser um espírito maligno (inacreditável em se tratando de mulher!).
Lilith se converteu, a posteriori, na primeira esposa de Adão, cuja presença original nunca terminou de eliminar-se totalmente do seu segundo matrimônio. A lenda tacha de insubordinação a atitude de Lilith, pois ela se negara a aceitar seu "lugar apropriado" que, aparentemente, era permanecer debaixo de Adão durante a relação sexual. Questionava ela o porquê de ficar por baixo dele já que ambos foram criados de barro, sendo, portanto, semelhantes. Adão por sua vez não teve argumentos convincentes para contestar a pergunta, de maneira que, ao pronunciar o nome mágico de Deus, Lilith se foi voando pelos ares até o Mar Vermelho. Ali dá à luz a mais de 100 demônios por dia.
Insatisfeito com a situação, Adão fala de sua esposa a Yahvé, que imediatamente enviou à sua procura três anjos: Senoi, Sansenoi e Samanglof. Eles a encontraram às margens do Mar Vermelho, onde mais tarde as tropas egípcias seriam engolidas por ordem de Moisés.
Como era de se esperar, Lilith se negou a voltar a ocupar seu lugar junto de Adão e fez ameaças dizendo que possuía poder de matar crianças. Então os anjos tentaram afogá-la no Mar Vermelho, porém Lilith advogou em causa própria e salvou sua vida com a condição de jamais causar dano a uma criança recém-nascida de onde viera seu nome escrito.
Finalmente Yahvé deu a Lilith, Sammael (Satã), e ela foi a primeira das quatro esposas do diabo e a perseguidora dos recém-nascidos.
Mas a ordem divina se converteu no centro de todas as fantasias de terror que provoca a sensação de indefesa, ou seja, Lilith poderia aparecer em qualquer momento da noite para levar uma criança, aterrorizando os pais dos pequenos. Podia também possuir um homem durante o sono. Esse constataria que havia caído debaixo de seu poder se encontrasse restos de sêmen ao despertar. É difícil evitar a conclusão de que Lilith se converteu em uma imagem de desejo sexual não reconhecido, reprimido e projetado sobre a mulher, que se converte em sedutora.
Continuou dizendo a ninfa Rosane que, em Gênesis, o mito estabelece que é a infração do mandamento de Yahvé (e não a sexualidade) a causa da expulsão do Paraíso à condição humana; e o conhecimento do bem e do mal, que alcançaram através da desobediência, tampouco se pode explicar em termos de conhecimento sexual. No entanto, tanto a desobediência como o conhecimento se associaram à sexualidade porque a primeira coisa que Adão e Eva "viram" quando "seus olhos se abriram" foi que estavam nus. Antes disso, andavam nus e sem vergonha.
A nudez, portanto, se converteu em sexualidade pecaminosa, especialmente quando a serpente fálica entra na especulação teológica. Em certas ocasiões a serpente era identificada como Lilith e se desenhava a serpente com um corpo de mulher, interpretando-se que a dita criatura era Lilith. Outras vezes a serpente tinha um rosto como o de Eva. Por esta razão, uma percepção da sexualidade como algo "não divino", invade as lendas de Lilith como aspecto escuro de Eva.
Cuidadosamente apagada da Bíblia cristã, Lilith permanece como símbolo de rebelião à repressão do feminino, na psique e na sociedade.
A ninfa Rosane Volpatto finaliza dizendo que tanto na literatura ortodoxa como na apócrifa, a sombra de Lilith seguiu cercando as mulheres até o século XV d.C. Nessa época, e utilizando as mesmas imagens incorporadas em Lilith, milhares delas foram acusadas de copular com o demônio, matar crianças e seduzir homens, ou seja, de serem bruxas. Segundo a ninfa, Lilith é o arquétipo da mulher indomada que luta apaixonadamente pelo poder pessoal, e suas características são: o destemor, a força, o entusiasmo e o individualismo; além de ser atividade e exuberância emocional.
Recuso-me a acreditar, querido diário, que uma mulher tão linda como a Lilith tenha se tornado um ser de espírito maligno, como bem relatou a ninfa Rosane.
Acredito que esse tal Adão não tenha dado a ela o seu devido e merecido valor, e talvez esteja aí o motivo de tamanha "insubordinação"!...

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